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domingo, 16 de março de 2014

"Mentidero" por Duarte Palha: Desmamar a aficion

Imagem: Joaquim Pedro Quintella


Lembro-me de fazer 6 anos e soprar as velas na cozinha da minha avó. Era um bolo de chocolate com
gomas em forma de golfinho. Podiam ser ursos, mas eu lembro-me de golfinhos. É talvez a primeira memória visual que sou capaz de identificar no tempo. Tenho outras memórias, que julgo anteriores, mais ou menos nítidas, mais ou menos leves, perdidas na incerteza do tempo.
Quase todas me trazem toiros, cavalos, campinos, forcados e toureiros. Quase todas me trazem a minha aficion.
Talvez mais intensa do que hoje. De usar panos de cozinha como capotes e colheres de pau como bandarilhas. O toiro era, muitas vezes, um banco - o banco parado no meio da sala, e eu em volta, a cravar ferros. Mais ou menos o mesmo que tourear um murube.
 Não me lembro se era egoísta, se era chorão, teimoso ou divertido. Lembro-me de gostar de toiros. Tenho esta certeza absoluta em relação a mim. Nasci apaixonado por “isto”. Antes da memória dos golfinhos no bolo de chocolate, lembro-me de tentas no campo.
Empoleirado nas varolas do tentadero da Quinta da Foz. E de querer e não poder ir aos currais, sem que alguém me levasse pela mão. E de ir aos toiros. Às corridas, ainda antes de me poder lembrar bem disso.
Lembro-me que esperava esses dias com uma ansiedade como hoje já não espero. Nem eu, nem muitos dos actuais aficionados imberbes esperarão. Querem roubar-lhes essa ansiedade.
Querem roubar a ansiedade a quem tenha menos de 12 anos. Querem acabar com as pegas a cabeças de toiro, feitas com os dedos dos pais, com as bandarilhas de colher de pau, com os capotes aos quadrados, com os bancos que marram.
 Mas nós diremos que não. Que não deixamos. Que é a luta que nos resta. Desobedecer cegamente. Porque não? Porque havemos de encarneirar sempre? Vamos, por uma vez, fazer as coisas à nossa maneira. Como queremos. Como seres livres que somos. Vamos levar crianças às praças. Mentir na idade que têm, escondê-las da polícia, fingir que não conhecemos a lei. Porque é essa a nossa obrigação.
Alimentar a aficion de quem a tem sem saber porquê. Porque um dia que eu seja pai, quero investir com um carrinho de mão, quero montar praças com lego, quero ir aos toiros e explicar que o forcado da cara não é um campino, por ter barrete.
Quero e hei-de fazê-lo.  Que não é a lei que mata a aficion. E não é a lei que nos impede de fazer o que queremos. Nunca foi.