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sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Mentidero: Duarte Palha escreve a Mestre Batista



Ilustração de Joaquim Pedro Quintella

Carta aberta a José Mestre Batista
Exmo Senhor José Mestre Batista,
Escrevo-lhe esta carta às onze da noite de um domingo de sol e moscas, que devia ter sido também de toiros. Sobrou-me o sol. Neste domingo, como em tantos outros, não fui aos toiros. Faltou-me o alento. Tenho o mar ao lado e sempre me soube bem a areia nos pés. Defeito meu.
 Escrevo-lhe porque sofro de sono e as bancadas aos meus pés costumam estar vazias. Estico as pernas e fecho os olhos entre ferro e ferro, se a noite anterior foi mal dormida ou o almoço bem bebido. Encosto-me no cimento, onde deviam estar uns joelhos, e assim me fico, imperturbável e dormente, pela corrida que não perturba nem acorda.
Escrevo-lhe pelas insuportáveis pevides que vão comendo ao meu lado, pelo fumo dos cigarros que entretêm a falta de pevides e pelas dores que sinto, de estar sentado. Escrevo-lhe pelas idas ao bar, onde me demoro, sem pressa ou peso de perder algo, e pelas idas à casa de banho que sucedem as anteriores. 
Escrevo-lhe pelas longas conversas, à porta dos sectores. Com os porteiros, com polícias, com bombeiros e quem mais aparecer. De lata de cerveja na mão, entre uma ida ao bar e outra à casa de banho. Escrevo porque vou saltitando de lugar, variando a companhia de toiro para toiro, e pelas gargalhadas, de costas voltadas para a praça, em graçolas que sobem e descem degraus.
Escrevo-lhe porque nada disto devia importar. Nem as pevides, nem as dores, nem o sono, nem as sedes, ou as conversas saltitantes. Tudo devia ser o que se passa para lá da trincheira. Devia querer estar sentado, agarrado ao lugar, de olhos postos na arena e levantar-me apenas para aplaudir. Mas eu, como quase todos, vou aos toiros como quem vai à praia - como neste domingo em que escrevo - com sestas ao sol, idas ao bar, conversas com quem está três toalhas ao lado e o mar, que é a razão de ali estarmos, apenas se espreita de vez em quando.
Exmº Senhor José Mestre Batista, por certo perguntar-se-á, e com toda a razão, porque o escolhi a si como destinatário deste desabafo sentido, se nunca o vi tourear e aí onde está já não tem obrigação ou possibilidade de voltar a prender-me os olhos à praça. Escrevo-lhe a si porque me falam os mais antigos que eu, do que o viram fazer e como lhes guardava a atenção. Como os prendia ao assento, como lhes parava o coração. Contam-me sobre esses dias porque ainda se lembram das coisas que o viram fazer. Enfim…escrevo-lhe porque a mim, que tão disperso anda o olhar na praça, custa-me não levar memórias que conte um dia....

Com os melhores cumprimentos,
Duarte Palha"